Justificativa

Vários indicadores contemporâneos nos sugerem que o campo da moda no Brasil está em franco processo de consolidação. Do ponto de vista dos meios de comunicação observamos sua especial atenção para o mundo da moda. Vários espaços exclusivos para a moda foram abertos no país : programas de televisão, cadernos e/ou colunas fixas em importantes jornais e uma crescente valorização das revistas especializadas em moda.

Atualmente são 11 títulos de revistas impressas direcionadas para o segmento. Editoras observam resultados positivos em termos de tiragem com edições que tratam o comportamento e têm o mundo da moda em suas matérias jornalísticas. O assunto circula nas pautas de jornais e periódicos, conquistando espaços exclusivos nos cadernos de cultura e colunas sociais. Nos informes econômicos a moda é tratada como "commodity". Na sessão de ciência e tecnologia uma fibra têxtil "inteligente" chama atenção até de quem não entende de moda.

Com o acesso à internet e a implantação da TV a cabo no Brasil torna-se possível acompanhar o fluxo da moda internacionalmente. Em sintonia com o que acontece no exterior, entram no ar, os primeiros sites e revistas eletrônicas com a intenção de reunir o crescente universo da moda brasileira, divulgando produtos, fornecedores, profissionais da área e calendário de eventos. Ainda na esfera da comunicação e marketing observamos empresas nacionais investindo tanto na divulgação, produção e promoção de desfiles de grifes nacionais, quanto em concursos que procuram novos talentos para alimentar o mundo da moda nacional.

De um ponto de vista macroeconômico, os indicadores disponíveis informam sobre a expressiva participação da moda no cenário da economia nacional. Dados relacionados apenas ao setor vestuário e fornecidos pela Associação Brasileira da Indústria do Vestuário (Abravest) apontam para um volume de produção física da ordem de 3.819.026.000 peças em 1996, movimentando um valor de aproximadamente US$ 27,5 bilhões. Tal perfil de produção implica na existência de 1.400.000 empregos diretos, o que equivale a cerca de 7.000.000 de pessoas com algum grau de dependência dessa atividade, apenas no setor vestuário de produção de vestuário. Portanto não estão computados os dados relativos a indústria têxtil em geral, bem como os de comercialização no varejo.

Em termos de comércio exterior, a balança encontra-se equilibrada em relação a exportação/importação com um movimento equivalente a US $ 300 milhões em ambas as modalidades. Segundo os dados da entidade, o mercado cresceu após a implantação do Plano Real, havendo maior consumo de peças de baixo valor, vendidas principalmente para as classes sociais com menor poder aquisitivo.

Podemos ressaltar, paralelamente a estes índices da mídia e da economia, o surgimento de várias faculdades de moda no Brasil, criadas a partir do final dos anos 80, e que têm neste curso um uma vasta clientela. Só na cidade de São Paulo existem quatro cursos superiores na área da moda, três dos quais plenamente consolidados, em termos de números de matrículas e continuidade das atividades acadêmicas. A moda como curso superior está presente ainda no Rio de Janeiro dentro da faculdade Veiga de Almeida, na Universidade Estadual de Londrina e na Universidade Federal do Ceará entre outras que estão em vias de institucionalização. Começa a surgir hoje no cenário da moda nacional um novo perfil do profissional da moda que provém destas faculdades.

Se, como mostram todos estes índices, o campo da moda está em plena consolidação em várias dimensões, o mesmo não ocorre na questão da construção do campo da moda enquanto campo de saber. A julgar pela pequena produção científica brasileira neste setor (e inclusive das próprias faculdades de moda), observamos uma carência teórico-metodológica centrada na especificidade da moda contemporânea e ainda da sistematização de todos estes novos dados que mostram o seu impacto na sociedade.

Um dos objetivos centrais do grupo portanto é, através dos trabalhos de seus membros, enriquecer a discussão da moda como objeto do saber científico, e da moda como campo de saber válido para as diversas disciplinas representadas pelos integrantes, desde a Antropologia, a História, a Sociologia até Ciência da Comunicação e Multimeios. Enquanto grupo voltado para a pesquisa, o objetivo é avançar uma discussão científica sobre moda nos campos de saber específicos de cada pesquisador, através das pesquisas individuais. Num plano mais geral, cada pesquisa e as discussões em conjunto do grupo têm também como objetivo a sistematização maior de uma compreensão da moda como campo do saber. A característica central do grupo é sua vocação para a pesquisa. Trata-se de uma posição firmada profissional, intelectual e existencialmente por um conjunto heterogêneo de pesquisadores - seja pela formação acadêmica, faixa etária ou inserção profissional, como pode ser verificado pelas súmulas curriculares - mas convergente em torno de um horizonte comum que é a institucionalização da pesquisa em moda.

Consideramos que a pesquisa encerra duas dimensões indissociáveis que são: a produção e a sistematização do conhecimento que impõe ao pesquisador primeiramente o esforço da definição de seu objeto, a coleta, organização, problematização e formulação de um discurso científico; contudo, intrinsecamente ligada a essa primeira dimensão encontra-se a questão da circulação das informações produzidas. O conhecimento científico só se legitima se compartilhado pelos pares que ajuízam, ou não, sua validade. Submetido à crítica permanente, é a própria comunidade científica que se encarrega da preservação e da fecundidade deste conhecimento através de um processo contínuo de revisão e citação.

Tradicionalmente, a circulação das informações especializadas se dá através das revistas científicas, dos congressos, seminários, encontros e demais eventos que propiciam a troca, o intercâmbio, o debate. Contudo, essa troca permanece, em boa medida, restrita aos círculos especializados. Há um "gargalo" no que diz respeito à disponibilização deste conhecimento ao público em geral interessado em temas científicos, bem como a apropriação das informações por segmentos do setor produtivo.

Desse modo, tomando em consideração as premissas acima, bem como o nível acentuado de dispersão das informações no setor ligado à Moda, o grupo concluiu que tão importante quanto produzir conhecimento nesse campo - contribuindo inclusive de forma mais efetiva para sua constituição enquanto instância de produção do saber - é viabilizar o acesso destas informações ao público geral ou especializado.

O compromisso com a disseminação dos resultados levou o grupo a propor desde as formas convencionais de divulgação aos segmentos especializados - através dos eventos e publicações de natureza científica - até a criação do banco de dados virtual. Nesse sentido, o objetivo do grupo é utilizar as ferramentas disponíveis para fazer avançar a circulação das informações. Ou seja, valer-se dos mecanismos tradicionais da área sem, contudo, desconhecer ou deixar de utilizar os novos recursos tecnológicos que potencializam os resultados esperados.

Portanto, não se trata de utilizar metodologias excludentes, mas de articular situações distintas, com a sensibilidade de incorporar as novas ferramentas de trabalho à disposição de quem produz e de quem processa as informações geradas. Trata-se, enfim, de conjugar a pesquisa com a permanente disponibilização dos dados, através de um site próprio

A criação do banco de dados é, da nossa perspectiva, um dos aspectos inovadores do projeto, ao lado da abordagem multidisciplinar da temática Moda e da proposta de sistematização do conhecimento com vistas à constituição de um campo de saber na área. Sua proposição resulta de uma concepção socialmente comprometida com a disseminação dos resultados de pesquisa, preocupação que, de resto, aparece também como prioridade das agências de fomento.